Amor Líquido

Sentar, abaixar a cabeça e ouvir uma música. Lembrar de alguém que poderia estar perto, pensar no que te faz falta e chegar à única e triste conclusão de que você não sabe direito o que é.Sabe que falta. Sabe que ali com você não está.
Ando pensando esses dias em ausências, ando pensando em relações humanas e os laços que produzimos por causa delas. Desde pequena enxergo a ligação como uma corda. Uma corda grossa, de um relacionamento verdadeiro, íntegro, intenso. Intenso.
Uma corda fina, de um relacionamento frágil, triste, pequeno. Quebradiço.
Um relacionamento novo, intenso na emoção e pequeno no tempo, ele se rompe e o que sai disso? Dois pedaços desiguais da corda. O meu, maior que o seu. O seu, maior que o dele.
E saio por aí, conhecendo gente, conversando com gente, olhando gente. Saio por aí conhecendo, te conhecendo, me conhecendo. Ando por aí num rumo sinuoso, costurando uma teia com todo mundo por quem me tornei responsável. Como é mesmo? "Você se torna responsável por aquilo que cativa". Quantos eu já não cativei?
E enrolei, enrolei minha corda na cabeça, no pescoço, nos braços, pernas, mãos dessas pessoas. E quis me livrar, e deixei todas elas presas ao encanto que eu exerci nelas.
E o mesmo comigo. Quantas já não me encantei? E quantas já fiquei presa? Quantas pessoas enrolaram as cordas, as lãs, os barbantes, os ferros, os arames, os fios, as roupas, as mãos em mim? E me deixaram, presas ao encantamento ao qual fui submetida e aí...cortaram.
"Por que tão afastado? Tão só? Renunciando a tudo que eu respeitava? Renunciando a esse próprio respeito? Por que essa dureza, essa desconfiança, esse ódio contra minha próprias virtudes?"...Humano...Demasiado humano. Isso que eu sou. Respeito minha natureza desrespeitando a sua, e criando laços que pra mim são duradouros hoje e amanhã serão cortados por mim mesma, porque não...não suporto a doçura de alguém que consiga me fazer sentir menos só. Não suporto, não suporte.
Aquela estória de que escritores são muito cruéis. Matam o prelúdio do amor por uma boa estória. Estão sempre matando a vida à procura de estórias. Mato a minha vida à procura de cordas e cordas e cordas...e...
Humano...demasiado humano.
Penso como o Caio. Não dá. Sei que fiz muito mal pras pessoas que me amaram. Não é paranóia não. É verdade.É aquela coisa de ser neuroticamente individualista que, quando acontece de alguém parecer aos meus olhos uma ameaça a essa individualidade, fico imediatamente cheia de espinhos - e corto relacionamentos com a maior frieza, as vezes firo, sou agressiva e tal...
...
É preciso acabar com esse medo de ser tocada lá no fundo. Ou é preciso que alguém me toque profundamente pra acabar com isso.
Palavras dele, minhas também. Ando por aí cortando fiozinhos, linhazinhas, cordas, barbantes, amarras. Rompendo com você, você, você, com ele, com ela. E criando outros, e rompendo esses outros, e recriando, e seguindo, seguindo seguindo...
Sigo por aí amando. Amor de malandro, amor leve, amor bossa nova.
Não deixa de ser amor, não deixa de ter você comigo, um pedacinho da sua corda ficou aqui comigo. Grande, pequeno, que seja. Você ficou comigo, e que mal há nisso?
Não há o ruim em relação humana. Você deixou um pedaço seu comigo, e eu deixei um pouco da minha alma pra você, e você seguiu e dividiu minha alma com outra pessoa, que dividirá com outra e aí nossa teia foi se completando, e nem quando eu morrer...nem quando eu morrer ela se romperá. Eu faltarei, mas um pedaço é seu, e isso não muda.
E praqueles que eu criei as grandes cordas. Praqueles que pra romper isso precisariam de uma serra, de fogo, de uma explosão...praqueles fica a saudade. Minha, deles. Fica a falta doída, que se levada pra lágrima, fica bonita, naquela aguinha com sal que eu, vc, vc, vc e todo mundo aqui um dia já derrubou, por mais duro que seja. A saudade amolece.
Pra você, meu amigo, eu deixo a minha saudade. Pra você, o meu amor mais belo, mais puro, mais verdade, meu amigo. Pra você, minhas lembranças, meus amores, minhas paixões, minhas conquistas, minhas perdas, minhas lágrimas, pra você todos os meus olhares, meu amigo.
Pra você que me colocou no seu olhar uma vez, leve um pedacinho aqui da minha corda. É seu. É o máximo de mim que eu posso dar, uma vez que estou indo.
Amigo, pra você todo o amor do mundo, toda a falta bonita que eu te faço, a falta bonita que você me faz. Ali, desembace a vidraça, como dizia Caio. Silencie, afaste, chore, renuncie, brigue, venha, despeça, recomece, recomeço.

Thaiza Akemi

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